A Comissão Mista de Orçamento (CMO) promoveu nesta terça-feira (23) uma audiência pública para debater a situação de obras públicas com indícios de irregularidades. O debate foi presidido pelo deputado federal Paulo Azi (DEM-BA), coordenador do Comitê de Avaliação das Informações sobre Obras e Serviços com Indícios de Irregularidades Graves (COI). Esse comitê é um colegiado interno da CMO que tem como atribuição analisar informações enviadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e, eventualmente, propor o bloqueio de ações com indícios de anormalidades.
Paulo Azi afirmou que as informações trazidas ao comitê são importantes para a tomada de decisões da CMO, inclusive para a exclusão de projetos do rol de obras com indícios de irregularidades. O debate, realizado de forma semipresencial, contou com a participação de representantes do TCU, da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e dos ministérios da Infraestrutura e do Desenvolvimento Regional.
O diretor de Transporte Ferroviário do Ministério da Infraestrutura, Ismael Trinks, afirmou que, a partir de 2019, a concessionária da ferrovia Transnordestina começou a apresentar os projetos para a ANTT. Segundo Trinks, os ajustes foram feitos até meados deste ano. Ele informou que a agência acatou os ajustes, mas apontou que ainda é preciso uma liberação do TCU. A ferrovia Transnordestina foi projetada para ligar o Porto de Pecém, no Ceará, ao Porto de Suape, em Pernambuco, além do cerrado do Piauí.
De acordo com Ismael Trinks, o governo não tem feito aportes na construção, diante da decisão do TCU de suspender repasse de recursos para a obra, ainda em 2017. Trinks disse que a obra tem recebido somente recursos privados. Desde 2019, acrescentou, a Transnordestina Logística S.A. (TLSA) colocou na obra recursos que somariam cerca de R$ 370 milhões.
O secretário de Infraestrutura Portuária e Ferroviária do TCU, Mauricio Ferreira Wanderley, informou que o processo está aguardando informações do Ministério da Infraestrutura a respeito de uma possível caducidade do contrato da Transnordestina. Ao responder a uma pergunta do deputado Paulo Azi, Wanderley disse que o TCU usou captação de imagem, com recursos de alta tecnologia, e identificou divergências em algumas informações a respeito da qualidade do trabalho e na comparação entre projeto e obra. Segundo o secretário, o trabalho não foi em frente por conta do aspecto privado do empreendimento. Ele disse que cabe à ANTT fazer a fiscalização da qualidade do trabalho e que “a agência está fazendo” isso.
Para o superintendente de Transporte Ferroviário substituto da ANTT, Fernando Augusto Formiga, o valor orçamentário de R$ 8,9 bilhões — aprovado recentemente pela agência para a Transnordestina — é um valor adequado para cobrir o total da obra, de cerca de 1.750 quilômetros. Ele disse que o valor pode ter uma pequena alteração, por questões pontuais. Segundo Formiga, caso venha a ser decretada a caducidade do contrato, terá de ser feito um cálculo mais criterioso a respeito da indenização.
— Já foi feito um levantamento a respeito do montante, mas eu não poderia dar detalhes aqui — afirmou o superintendente.
No caso da BR-116, o secretário de Fiscalização de Infraestrutura Rodoviária e de Aviação do TCU, Luiz Fernando de Souza, afirmou que o tribunal identificou irregularidades, inicialmente apontadas como graves, com indicativo de paralisação para a obra. A BR-116 vai desde o Rio Grande do Sul até o Ceará, com um total de cerca de 4,5 mil quilômetros. O trecho com irregularidades fica na Bahia, entre os municípios de Feira de Santana e Salvador.
Souza lembrou que, em 2019, o TCU indicou a obra para o quadro de bloqueio e, posteriormente, a CMO promoveu a exclusão dessa obra do quadro. Ele disse que as medidas saneadoras não foram cumpridas até o momento. Por isso, o TCU tem mantido a indicação da obra com indícios de irregularidade grave. Ele ponderou que não houve, ainda, deliberação do Plenário do TCU sobre o assunto.
Na visão do deputado federal João Bacelar (PL-BA), é importante a comissão fazer esse tipo de debate com os órgãos de controle. Ele disse ter a sensação de que o TCU está exorbitando de suas competências quando vai contra decisão da CMO em relação a obras com indícios de irregularidades. Para o deputado, se a CMO decide por retirar uma obra, o TCU não deveria ter condições de colocá-la novamente entre as suspeitas. Ele fez referência ao fato de o TCU ter colocado a ferrovia no rol de obras com indícios de irregularidades e a CMO tê-la retirado desse rol. Segundo o deputado, essa situação vem ocorrendo desde 2019.
— O TCU está desrespeitando o Congresso. Mais uma vez o TCU desrespeita a CMO — afirmou ele.
Para o coordenador-geral de Construção Rodoviária do Dnit, Alisson Jobim Nascimento, a importância da rodovia é incontestável. Ele disse que o órgão vem tomando providências para a regularização da obra. Segundo Nascimento, a empresa concessionária se recusou a fazer as alterações recomendadas e o Dnit abriu um processo administrativo para apurar a situação.
— Hoje, a situação está na Justiça, com vistas à rescisão do contrato — informou Nascimento.
De acordo com o superintendente regional do Dnit na Bahia, Amauri Souza Lima, a empresa que foi a segunda colocada na licitação teria condições de atender às exigências feitas pelo TCU. Ele disse que, por conta da judicialização, não é possível fornecer todas as informações demandadas pelo tribunal.
— Acho que houve um pouco de precipitação do TCU nesse caso — opinou o superintendente.
O deputado federal Claudio Cajado (PP-BA) disse que a duplicação desse trecho da rodovia da BR-116 é essencial para a agilização do transporte de cargas e passageiros na região. Ele afirmou que essa obra não pode ficar parada e lamentou o fato de o problema se arrastar há mais de três anos.
O secretário Luiz Fernando Souza, do TCU, informou que o contrato da BR-235 já está concluído, mas ainda está com indicativo de irregularidade grave. Segundo Souza, a discussão a respeito dos valores remanescentes permanece. A BR-235 é uma rodovia que vai desde o estado da Bahia até o Pará. As irregularidades foram identificadas em um trecho na Bahia.
O coordenador Alisson Nascimento, do Dnit, afirmou que a rodovia é muito importante para a integração regional, incluindo os estados de Sergipe e Piauí. Ele disse que o Dnit já apresentou algumas medidas para o TCU, mas apontou que o tribunal não aceitou as razões apresentadas.
— A obra está praticamente acabada. Estamos apenas aguardando a resolução da tomada de contas especial para fazer o termo de recebimento da obra — disse Nascimento.
Em relação à obra do BRT de Palmas (TO), o secretário de Fiscalização de Infraestrutura Urbana do TCU, Samuel Sá Teles, afirmou que a fiscalização do tribunal identificou que o estudo de viabilidade técnica da obra se mostrava deficiente. Em 2017, o TCU recomendou medidas saneadoras para o município de Palmas. Ele disse, porém, que as informações enviadas não foram consideradas satisfatórias. Em 2020, o TCU entendeu que, diante da suspensão do contrato do governo federal com a capital do Tocantins, já não havia irregularidades envolvendo recursos federais.
O procurador do município de Palmas, Mário José Ribas, confirmou que a formalização da revogação do contrato deve ser feita de forma administrativa, nos próximos dias. Ele disse que a situação será informada ao TCU e à CMO.
Conforme informou Luiz Fernando Souza, do TCU, a União fez aporte de recursos dentro do contrato de concessão do trecho da BR-040 que liga o Rio de Janeiro (RJ) a Juiz de Fora (MG). O TCU identificou indícios de sobrepreço e projeto desatualizado. Em 2017, o tribunal recomendou a paralisação da obra. Souza ressaltou que a obra já estava parada por falta de recursos federais. Até hoje, acrescentou o secretário, não foram apresentadas as medidas saneadoras — e por isso o TCU tem mantido a indicação de suspensão de recursos.
O coordenador de Informações em Processos Arbitrais da ANTT, Carlos Eduardo Neves, afirmou que o contrato permanece em vigor por conta de duas decisões judiciais. Ele destacou que a agência está limitada diante do posicionamento da Justiça. Segundo Neves, a ANTT fez um termo de parceria com a Universidade Federal de Santa Cataria (UFSC) para buscar atender às exigências do TCU, principalmente em relação aos valores relacionados ao projeto executivo e a deveres e direitos da concessionária. Ele acrescentou que já estão avançados os estudos sobre o quanto a concessionária estaria devendo para a agência, e apontou que, em breve, a obra já não mais constará do Orçamento da União.
A CMO tem a finalidade de examinar e emitir parecer sobre os projetos de lei do plano plurianual, das diretrizes orçamentárias, de lei orçamentária anual e seus créditos adicionais e sobre as contas apresentadas anualmente pelo presidente da República. A comissão também tem a competência para exercer o acompanhamento e a fiscalização da execução orçamentária e para emitir parecer sobre os planos e programas nacionais, regionais e setoriais.
A comissão é atualmente presidida pela senadora Rose de Freitas (MDB-ES) e tem como relator o deputado federal Hugo Leal (PSD-RJ). O relatório preliminar acerca do Orçamento de 2022 (PLN 19/2021) deve ser votado na comissão no dia 2 de dezembro.
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