O silenciamento do Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência (Conade) — que desde abril deste ano está sem conselheiros eleitos, em razão da não abertura de edital pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos — preocupa senadores e especialistas que, nesta segunda-feira (29), participaram de audiência pública da Comissão de Direitos Humanos (CDH) para discutir a situação.
Sugerido pela senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP) e pelo senador Fabiano Contarato (Rede-ES), o debate, às vésperas do Dia Internacional da Pessoa com Deficiência (3 de dezembro), apontou o desmantelamento da representatividade das pessoas com deficiência e o descumprimento do que está previsto na Constituição, na Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI) e em convenção da Organização das Nações Unidas (ONU).
— Tanto a convenção quanto a LBI foram construídas pela sociedade, e agora temos sigilos até em relatórios — lamentou Mara Gabrilli.
Emocionada, a senadora afirmou que acredita no imenso diferencial das pessoas com deficiência e que considera muito agrave essa suspensão do Conade há mais de sete meses “por omissão do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos”. A parlamentar cobrou ainda transparência na regulamentação do instrumento de avaliação biopsicossocial, previsto na LBI.
— O Senado não poderia ficar calado diante da gravidade desses fatos. O ministério está indo na contramão do tema internacional da pessoa com deficiência. Não há muito o que comemorar nesse 3 de dezembro: as pessoas com deficiência ainda estão sendo tratadas como pessoas secundárias.
Presidente da Associação Nacional do Ministério Público de Defesa dos Direitos dos Idosos e Pessoas com Deficiência (Ampid), Maria Aparecida Gugel enfatizou que essas ações governamentais que decorrem do controle social necessitam da participação do povo, e “isso está claro na Constituição”:
— A ausência do Conade no controle social tem algo de muito errado. Essa agonia da qual sofre o Conade, desde dezembro de 2019, quando tivemos um novo decreto (com alteração de sua composição, com previsão de eleição por processo seletivo), é geradora de algo muito sério.
Maria Aparecida propôs o encaminhamento com máxima urgência de projeto de lei para a (re)criação do Conade por meio de uma lei ordinária, com autonomia e independência, além de um fundo respectivo.
Representante da Rede Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, Ana Claudia Figueiredo questionou a pesquisa sobre a análise do Índice de Funcionalidade Brasileiro Modificado (IFBrM) em requerentes do Benefício de Prestação Continuada (BPC) para a pessoa com deficiência, conduzida pelo Ministério da Economia e pelo Ministério da Cidadania, a despeito de a competência sobre o assunto ser do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.
A pesquisa é parte do relatório do Grupo de Trabalho Interinstitucional (GTI) para o Modelo Único de Avaliação Biopsicossocial da Deficiência, que regulamentará o artigo 2º da LBI. O relatório estaria sob sigilo, segundo Cláudia.
— É muito grave o silêncio do Conade diante de discussões como essa.
Da mesma forma, a médica fisiatra Izabel Maior, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e ex-secretária nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência, cobrou que o governo entregue à sociedade civil um processo de eleição dos conselheiros do Conade.
— Quase todo dia 3 de dezembro, ao invés de comemorarmos, estamos sempre reagindo a algum fato. Não tivemos apenas a paralisação do Conade, mas a sua mutilação. Ele já vinha deturpado (...) Há uma série de pressões que não cabem no regime democrático.
O presidente da Comissão Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Conselho Federal da OAB, Joelson Costa Dias, defendeu “a necessária transparência e celeridade” na regulamentação do instrumento de avaliação biopsicossocial.
— Chega a ser exaustivo repetir o arcabouço normativo que protege os direitos das pessoas com deficiência. Não é uma proposta programática, um protocolo de intenções. Exige uma força normativa.
Dias destacou que o não funcionamento do Conade impossibilita acompanhar a criação desse instrumento. Para o representante da OAB, “passa da hora de se convocar o presidente do INSS e a ministra dos Direitos Humanos para que prestem as informações necessárias”.
A proposta da OAB, segundo Dias, é de judicializar essa questão para que haja o compartilhamento de relatório do instrumento de avaliação, assim como exigir o próprio retorno do conselho.
A coordenadora da Comissão de Direitos das Pessoas com Deficiência, da Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos (Anadep), Renata Flores Tibyriçá, relatou que as pessoas têm procurado a defensoria porque não estão alcançando seus direitos, pela inexistência da avaliação biopsicossocial.
— A LBI trouxe um dispositivo específico prevendo a avaliação biopsicossocial e obrigou que o Poder Executivo fizesse instrumentos e os disponibilizasse em dois anos. Mas já há quatro anos de demora, porque ainda não foi apresentado.
Segundo a coordenadora, as pessoas reclamam, por exemplo, das muitas idas e vindas aos médicos, que não preenchem documentos da forma correta pela falta do instrumento de avaliação que os oriente melhor.
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