Famílias de baixa renda começaram a receber em novembro o Auxílio Brasil, novo programa de renda do governo federal, que foi criado para substituir o Bolsa Família. A entrega da primeira parcela foi a culminação de quase um ano inteiro de negociações parlamentares para encontrar espaço para o novo programa no Orçamento federal.
A ideia de um novo programa permanente de renda básica ganhou tração já em março, quando o Congresso promulgou a emenda constitucional que permitiu prorrogar em 2021 o auxílio emergencial, estabelecido no ano anterior (EC 109). O caráter temporário do auxílio emergencial levou o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, a defender a busca por uma alternativa em caráter permanente.
A opção do governo federal foi substituir o Bolsa Família, em vigor desde 2003, por um novo programa que atingisse mais famílias e pagasse um valor maior. Batizado de Auxílio Brasil e introduzido em agosto por meio de medida provisória (MP 1.061/2021), o programa foi incluído no projeto de Lei Orçamentária Anual de 2022 (PLN 19/2021), mas trazia os mesmos parâmetros do Bolsa Família.
A primeira opção considerada para financiar a expansão do Auxílio Brasil foi a proposta de reforma do Imposto de Renda (PL 2.337/2021), que previu medidas arrecadatórias como a tributação sobre lucros e dividendos, a revisão de benefícios fiscais e o aumento da contribuição social sobre a mineração. O projeto teve aprovação célere na Câmara dos Deputados e chegou ao Senado em setembro.
No entanto, a proposta enfrentou múltiplas resistências. Audiências públicas com economistas e representantes da educação apontaram falhas no desenho da reforma, e a Instituição Fiscal Independente (IFI) avaliou que a iniciativa resultaria em déficit para os cofres públicos. O Congresso chegou a aceitar uma ideia do Executivo que permitiria lastrear a expansão do Auxílio Brasil na expectativa de receitas da reforma do IR, mesmo antes da aprovação do projeto (PLN 12/2021).
O clima não melhorou, porém, e a reforma acabou empacando na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), onde está até hoje. Em novembro, Rodrigo Pacheco fez críticas à iniciativa.
— Não podemos, a pretexto de sustentar qualquer tipo de programa, querer aumentar imposto. Isso não tem o menor cabimento a esta altura — disse.
Simultaneamente à reforma do IR, o Congresso estudava outro caminho para abrir espaço fiscal no Orçamento de 2022. No início de agosto, Pacheco e o presidente da Câmara, Arthur Lira, se reuniram com ministros do Planalto para estudar a possibilidade de limitar as despesas da União com o pagamento de precatórios — dívidas reconhecidas judicialmente. Logo as conversas chegaram também ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux.
O resultado das negociações foi a PEC dos Precatórios (PEC 23/2021), que estabeleceu um teto para o desembolso anual da União com essa despesa. Na sua passagem pela Câmara, a PEC ainda ganhou dispositivos que alteram o cálculo do teto de gastos — o resultado foi a produção de uma folga fiscal ainda mais larga. No Senado, garantiu-se que essa folga seria usada, em 2022, exclusivamente para o atendimento de políticas sociais, como o Auxílio Brasil.
O presidente Rodrigo Pacheco decidiu promulgar imediatamente as partes da PEC que já eram consensuais entre a Câmara e o Senado, o que originou a Emenda Constitucional 113. Posteriormente, a Câmara aprovou a PEC 46/2021, que recebeu os trechos da PEC dos Precatórios sugeridos pelos senadores. Com isso, também foi promulgada a Emenda Constitucional 114, estabelecendo os limites de pagamento dos precatórios e a aplicação dos recursos economizados em 2022 exclusivamente em seguridade social e em programas de transferência de renda.
Os recursos para garantir o Auxílio Brasil em 2021 foram assegurados por meio de créditos especiais, cuja liberação foi confirmada pelo Congresso ainda no início de novembro (PLN 26/2021). Na mesma sessão os congressistas garantiram que o programa fosse incluído no Plano Plurianual (PPA), que orienta a elaboração orçamentária até 2023 (PLN 23/2021).
No início do mês o governo publicou uma medida provisória para garantir que as parcelas do Auxílio Brasil chegarão ao valor de R$ 400 (MP 1.076/2021) — o benefício médio foi estabelecido em R$ 224. A garantia pode ser estendida até dezembro de 2022.
A MP do Auxílio Brasil ainda não foi sancionada pelo Planalto, que tem até o dia 29 de dezembro para fazê-lo.
Outra política social que ocupou os trabalhos do Congresso em 2021, especialmente no final do ano, foi o programa Gás dos Brasileiros, que subsidia a compra de gás de cozinha para famílias de baixa renda. As famílias beneficiadas receberão um auxílio bimestral no valor de, no mínimo, metade da média do preço nacional de referência do botijão de gás de 13 quilos. Para estimar a concessão do benefício, o Ministério de Minas e Energia calcula o valor médio do botijão em R$ 102,48 neste ano e em R$ 112,48 em 2022.
O programa deve beneficiar as famílias inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico) com renda familiar mensal per capita menor ou igual a meio salário mínimo ou que morem na mesma casa de beneficiário do Benefício de Prestação Continuada (BPC). O auxílio será concedido preferencialmente às famílias com mulheres vítimas de violência doméstica sob o monitoramento de medidas protetivas de urgência.
O Senado começou a se debruçar sobre o tema ainda no primeiro semestre, com projetos apresentados pelos senadores Paulo Paim (PT-RS) (PL 1.507/2021) e Eduardo Braga (MDB-AM) (PL 2.350/2021). O texto de Braga, que sugeria subsídio de 40% do valor do botijão, chegou a ser pautado diretamente no Plenário, mas foi adiado por três vezes.
Em outubro o Senado recebeu uma terceira proposta, dessa vez da Câmara dos Deputados (PL 1.374/2021). Os três projetos foram unificados e, assim, o tema avançou, com o aumento no valor do vale. A aprovação veio ainda em outubro, e a sanção, em novembro.
Para custear o Gás dos Brasileiros, a Presidência da República sancionou no dia 22 de dezembro a Lei 14.263, que abre crédito especial de R$ 300 milhões para o programa. Essa lei teve origem no PLN 42/2021, projeto de lei aprovado em 17 de dezembro pelo Congresso.
A expectativa é atender 5,5 milhões de famílias já em 2021 e admitir a entrada gradativa de mais famílias no programa a partir do próximo ano.
O vale-gás do governo federal foi uma solução do Congresso para minimizar os efeitos dos crescentes aumentos no preço dos combustíveis, mas o Senado também se mobilizou na reta final do ano para abordar o problema na sua raiz. A Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) aprovou a proposta de uma nova política de preços para derivados de petróleo, que também conta com um fundo de estabilização contra a volatilidade dos índices (PL 1.472/2021). O texto pode ser votado pelo Plenário no ano que vem.
O Senado também iniciará 2022 com a previsão de votação de um projeto de lei complementar que muda o cálculo da cobrança do ICMS sobre combustíveis (PLP 11/2020). A proposta seria outra ferramenta para conter os preços de itens como gasolina, diesel e gás. A tramitação desse texto, porém, deverá ser mais cautelosa. Pacheco quer ouvir os governadores sobre o assunto, uma vez que eles seriam os mais afetados por uma mudança que afetasse a arrecadação do ICMS — um imposto estadual.
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