O retorno da franquia de bagagens aos passageiros deixou em lados opostos representantes dos consumidores e das companhias aéreas, em uma audiência pública no Senado nesta quinta-feira (5). A reunião foi promovida pelas Comissões de Infraestrutura (CI) e de Assuntos Econômicos (CAE) para tratar da Medida Provisória (MPV) 1.089/2021, que muda regras da aviação civil brasileira. A iniciativa partiu dos senadores Nelsinho Trad (PSD-MS) e Carlos Viana (PL-MG), relator da proposta.
A medida, conhecida como MP do Voo Simples, foi editada no fim do ano passado e promove alterações no Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei 7.565, de 1986) e em outras normas que disciplinam o transporte aéreo no país, com o intuito de atrair investidores e desburocratizar o setor.
Os deputados fizeram alterações no texto, que resultaram num projeto de lei de conversão (PLV 5/2022). Entre as mudanças, está a garantia ao passageiro de despachar gratuitamente uma bagagem de até 23 quilos em voos nacionais e até 30 quilos em voos internacionais. Atualmente as companhias estão autorizadas a cobrar pelo despacho.
Nelsinho Trad admitiu que o tema é delicado e disse que o setor já prestou, em outros tempos, serviços melhores com preços menores. Houve época, segundo ele, em que a passagem era mais barata, não se cobrava bagagem e havia bom atendimento de bordo.
O parlamentar reconheceu os problemas causados pela pandemia, pelo aumento do dólar e pela guerra na Ucrânia e disse que a situação estaria ainda pior se governo e o Congresso Nacional não tivessem feito a parte deles para amenizar ao máximo os impactos no setor.
O senador Carlos Portinho (PL-RJ), por sua vez, reclamou da desorganização das empresas e da situação difícil pela qual passam os viajantes em relação às bagagens. Ele destacou que o passageiro que despacha a mala no balcão do aeroporto tem que pagar tarifas elevadas; no entanto, muitos chegam à porta do avião com seus pertences de mão e conseguem despachá-los gratuitamente, visto que a empresa sabe que não tem como acomodar tudo na cabine.
O advogado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Walter Faiad, deixou claro não ser contra a expansão e os lucros das empresas, mas disse que não aceita mais falsas promessas de passagens mais baratas nem a justificativa da segurança jurídica.
— A segurança jurídica no Brasil é só pra investidor; ninguém fala em segurança jurídica para o consumidor. Onde está o preço baixo, conforme o prometido quando começaram a cobrar as bagagens? O sujeito continua viajando com mochila nas costas pagando três vezes mais caro — reclamou.
O representante do Idec lembrou que o brasileiro tem ainda mais necessidade de levar bagagem por morar num país de dimensões continentais, diferentemente de um cidadão suíço, por exemplo. Ele também reclamou dos algoritmos usados pelas companhias aéreas e que elevam rápida e bruscamente o preço dos bilhetes.
— Quem explica o que o computador faz comigo quando o trecho sobe de uma hora pra outra? Em nenhum modal existe uma alta tão absurda — afirmou.
O presidente da Associação Brasileira de Empresas Aéreas (Abear), Eduardo Sanowicz, disse que foi criado o mito da bagagem gratuita, o que não existe. Na verdade, segundo ele, havia a divisão de custo para todos os passageiros. E quem fazia viagem curta e de bate-volta pagava para os demais.
O secretário nacional de Aviação Civil, Ronei Saggioro Glanzmann, por sua vez, informou que o governo vê com preocupação um possível retorno da franquia de bagagem, que vai contra o objetivo da MP, que é incentivar a entrada de novas companhias no setor e incentivar a concorrência.
— De fato as tarifas estão muito caras, o governo reconhece isso. Mas entendemos que aqui está sendo dado um remédio errado. O remédio passa longe da franquia de bagagem, pois há questões estruturais que precisam ser atacadas, como o alto preço do combustível de aviação, por exemplo, que responde por 35% a 40% dos custos — avaliou.
O diretor-presidente da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), Juliano Alcântara Noman, informou que a cobrança por bagagem alinhou o Brasil ao mercado internacional, e logo depois que a Câmara aprovou a volta da franquia, empresas que operam em sistema de baixo custo (low coast) já avisaram que estão reavaliando a entrada no mercado nacional.
— De fato, o remédio aplicado para o problema do preço, que está alto mesmo, foi errado, porque traz duas consequências: reduz competição e pressiona custo das companhias para o alto — advertiu.
Relator da proposta no Senado, Carlos Viana (PL-MG) não se posicionou especificamente sobre o tema durante a reunião. A MP 1.089/2021 perde a validade em 1º de junho.
O texto encaminhado pelo Executivo autoriza "a qualquer pessoa, natural ou jurídica", a exploração de serviços aéreos e retira da Lei 7.565 a necessidade de autorização prévia da autoridade aeronáutica para construir aeroportos e a necessidade de cadastro, homologação e registro de aeródromos civis. Também autoriza o Executivo a realizar parcerias público-privadas (PPPs) em aeroportos menores e simplifica a Taxa de Fiscalização da Aviação Civil.
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