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Perto de completar oito anos, PNE tem execução “insatisfatória”

O Plano Nacional de Educação (PNE) chega na reta final da sua execução com resultados insatisfatórios, problemas de desigualdade e apagão de dados....

20/06/2022 às 20h55
Por: Nathaly Guimarães Fonte: Agência Senado
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Sessão temática discutiu os rumos do PNE que completará o seu oitavo e antepenúltimo ano de vigência nos próximos dias - Jefferson Rudy/Agência Senado
Sessão temática discutiu os rumos do PNE que completará o seu oitavo e antepenúltimo ano de vigência nos próximos dias - Jefferson Rudy/Agência Senado

O Plano Nacional de Educação (PNE) chega na reta final da sua execução com resultados insatisfatórios, problemas de desigualdade e apagão de dados. Foi o alerta dado ao Senado Federal, nesta segunda-feira (20), por especialistas convidados para uma sessão temática que discutiu os rumos do PNE, que completará o seu oitavo e antepenúltimo ano de vigência nos próximos dias.

Durante a sessão, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) apresentou os resultados do seu mais recente ciclo bianual de monitoramento das metas do PNE. Segundo Gustavo Henrique Moraes, coordenador-geral de Instrumentos e Medidas Educacionais do INEP, os números mostram avanço limitado da educação brasileira durante a vigência do PNE.

Moraes explicou duas métricas usadas pelo INEP para medir o andamento de indicadores educacionais: o nível de alcance e o nível de execução. O primeiro mede a proximidade do indicador da meta estabelecida pelo PNE, enquanto o segundo compara o patamar do indicador em 2014 com o atual para avaliar o quanto ele avançou dentro da vigência do Plano. Em geral, explicou ele, os níveis de execução estão muito abaixo dos níveis de alcance, o que significa pouco incremento realizado desde que o PNE foi lançado. 

— A educação brasileira tem crescimentos significativos que devem ser comemorados por todos que se dedicam a ela, mas a execução do PNE é insatisfatória, estando na metade do nível desejado — advertiu.

Compilados todos os 56 indicadores, o INEP estima um nível de alcance de 81,1% na mediana, o que significa que a “obra educacional” do Brasil já ultrapassou 4/5 daquilo que foi determinado pelo PNE. No entanto, a maior parte disso já estava encaminhada quando a legislação entrou em vigor: o nível de execução não passa de 39%, também na mediana. A conclusão é que os anos de vigência do PNE contribuíram pouco para os ganhos do país.

Essa avaliação foi reforçada por Andressa Pellanda, coordenadora-geral da Campanha Nacional Pelo Direito à Educação. Ela observou que, além do avanço limitado, várias metas do PNE apresentam retrocesso em relação aos anos anteriores, como a taxa de frequência no ensino médio, as matrículas na educação profissional e as titulações de mestres e doutores. Para ela, os resultados são fruto de decisões equivocadas na política e na gestão.

— Temos uma queda de financiamento, cortes sucessivos, vemos políticas que vão na contramão do plano: educação domiciliar, militarização das escolas, discriminação e censura nas escolas

A avaliação do Inep será divulgada oficialmente na sexta-feira (24). Entre os resultados antecipados, Gustavo Henrique Moraes chamou atenção para as taxas de proficiência escolar, conforme medida pelo Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) do Inep. A avaliação é feita no 2º ano do ensino fundamental. Pelos critérios do Ministério da Educação, apenas 34,2% dos estudantes nesse estágio podem ser considerados alfabetizados na língua portuguesa, e apenas 31,7% estão no nível desejado de compreensão matemática.

Além disso, o atendimento escolar de crianças entre 6 e 14 anos retrocedeu para o nível anterior ao PNE: a taxa de cobertura caiu abaixo de 96% pela primeira vez em 10 anos. A meta do Plano é que todas as crianças nessa faixa etária estejam na escola.

Pandemia e dados

Os convidados também advertiram que o Brasil ainda não sabe o tamanho do impacto causado pela pandemia na estrutura educacional. Parte disso se deve à falta de dados, conforme explicou Gustavo Henrique Moraes.

— O censo demográfico, que precisava ser realizado em 2020, não foi realizado. Isso prejudica o cálculo de alguns indicadores, que infelizmente não puderam ser feitos. Houve também alterações importantes na Pnad [Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios]. Ela é presencial, mas graças à pandemia precisou ser mudada para uma coleta por telefone. Isso gera alguns problemas metodológicos.

Além de dificultar a mensuração, a ausência de informações pode prejudicar a própria aplicação do PNE. Lara Simielle, da Associação Dados para um Debate Democrático na Educação (D3E), lembrou que uma das metas, que trata da gestão democrática das escolas, é requisito para a distribuição de recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).

— Temos dificuldade tanto com o levantamento dos dados quanto com a divulgação a tempo desses dados. Faltam dados sobre diretores e diretoras, sobre sua seleção e formação, sobre a participação da comunidade na elaboração do projeto político pedagógico. É uma meta central, mas não conseguimos monitorar o cumprimento — afirmou.

Essa falta de subsídios, em conjunto com os efeitos ainda não identificados da pandemia, colocam em xeque o próprio PNE, mesmo na reta final da sua execução. Para Maria Helena Guimarães de Castro, presidente do Conselho Nacional de Educação, é temerário 

—  Não sabemos sequer qual foi o tamanho da queda no processo de ensino e aprendizagem durante a pandemia. Ainda não temos os dados do Saeb 2021, e já sabemos que alguns estados que fizeram avaliação tiveram quedas profundas. Me parece absolutamente irresponsável pensarmos no cumprimento dessas metas sem olhar para o quadro presente que estamos vivendo. O que mais me preocupa é dar conta da recomposição das aprendizagens das crianças, do atendimento a todas para que permaneçam na escola, para que superem as defasagens e os desafios socioemocionais que estão sendo enfrentados pelas escolas do Brasil todo — argumentou.

Lucas Hoogerbrugge, líder de Relações Governamentais da ONG Todos Pela Educação, opinou que é arriscado tratar a educação com uma lógica de “terra arrasada”, mas disse concordar que os impactos dos últimos dois anos foram severos.

— Num cenário onde a gente sequer está conseguindo ter aula, onde muitos lugares deram pouco ou nenhum suporte para os estudantes e para os professores, nesse período em que a gente ainda está com problemas tão básicos em relação às condições para as escolas funcionarem, é difícil olhar para os últimos anos e entender que um PNE era possível — lamentou.

O senador Flávio Arns (Podemos-PR), que solicitou a sessão de debates, ponderou que as dificuldades exacerbadas pela pandemia já existiam antes, e que o país não pode se desviar das diretrizes do PNE neste momento, uma vez que elas podem ajudar na recuperação.

— A pandemia não anula o PNE, porque, se tivéssemos tudo isso também à disposição do Plano, a vida seria muito mais fácil agora. Nós queremos que as crianças, os adolescentes, jovens tenham esse acolhimento numa infraestrutura boa, bonita, confortável, com biblioteca, quadra de esportes.

Desigualdades

Outro tema abordado nos debates foi a correção de desigualdades e o respeito a particularidades regionais. Alexsander Moreira, coordenador-geral de Apoio às Redes e Infraestrutura Educacional do Ministério da Educação, enfatizou a necessidade de coordenação entre o PNE e as políticas de cada ente da federação.

— Sem o cumprimento das metas dos planos subnacionais, não tem cumprimento da meta do Plano Nacional de Educação. O ministério tem trabalhado em apoio aos entes subnacionais, com uma plataforma que hoje nos permite conhecer os planos subnacionais em cada uma das suas metas e estratégias — disse.

Manoel Humberto Gonzaga Lima, coordenador do Fórum Nacional de Educação (FNE), também destacou o trabalho de acompanhamento dos planos municipais como uma conquista importante, e ressaltou que a plataforma do ministério permitiu a identificação de problemas de formulação e execução nas estratégias locais.

Já Luiz Miguel Martins Garcia, presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais da Educação (UNDIME), lançou um apelo em face das eleições gerais que acontecerão em outubro. Para ele, os candidatos devem estar sintonizados com aquilo que a sociedade já pactuou em objetivos nacionais, estaduais e municipais antes de lançar as suas propostas. Acima de tudo, afirmou ele, deve estar o PNE.

— É importante termos diretrizes de implementação que sejam de âmbito nacional, respeitando os regionalismos, mas precisamos desse rumo para que as ações em regime de colaboração possam ser viabilizadas. Todo candidato tem que saber que existe um plano que deve ancorar todos os seus sonhos enquanto gestor — afirmou.

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