A comissão do Senado que analisa a crise humanitária vivida pelo povo ianomâmi apresentará ao governo uma estratégia de ações permanentes para evitar que o quadro trágico volte a se repetir nas terras indígenas. O foco do relatório final foi apresentado nesta sexta-feira (14) pelo presidente do grupo, senador Chico Rodrigues (PSB-RR), durante a última audiência pública do colegiado, realizada em Boa Vista. A comissão ouviu diversas autoridades e representantes dos ianomâmis em Roraima, não só na audiência, mas durante toda a semana, em diligência externa. Na manhã desta sexta, os senadores também se reuniram com o governador do estado, Antonio Denarium, e outras autoridades. O foco do relatório final, que será elaborado pelo senador Dr. Hiran (PP-RR), também foi apoiado pelo senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR). Ele afirmou que a crise envolvendo os ianomâmis e a invasão de garimpeiros ilegais na região já dura mais de 50 anos. Segundo o parlamentar, as ações pontuais das forças estatais dirimem em alguns momentos os conflitos de interesses envolvendo indígenas e invasores, mas assim que as ações são desmobilizadas, os garimpeiros ilegais voltam a ocupar diversas áreas das terras indígenas. Por isso a presença estatal deve ser permanente, não apenas na fiscalização e repressão aos invasores, mas também na saúde e assistência social, alertou Mecias. Visita às terras Chico Rodrigues esclareceu que a comissão não visitou o território ianomâmi durante a diligência externa, porque optou por acatar sugestão do Ministério da Saúde. A pasta sugeriu que a visita somente ocorresse após o dia 20 de abril, então a comissão optou por focar em ouvir o máximo dos atores envolvidos, incluindo os próprios indígenas, em vez da visita in loco ao território. Alguns dos senadores da comissão, como Astronauta Marcos Pontes (PL-SP), deixaram claro que pretendem ir pessoalmente às terras ianomâmi assim que for possível. No Plenário do Senado, nesta quinta-feira (13), a senadora Damares Alves (Republicanos-DF), que também faz parte da comissão, reclamou que os senadores não puderam visitar os territórios devido à "influência de ONGs de extrema esquerda" na Funai. Ela relatou que quando foi ministra na gestão Jair Bolsonaro, sempre que manifestou interesse em ir lá, foi "desaconselhada" a ir, devido à ação dessas ONGs. Damares ainda afirmou que autoridades da Noruega e outros estrangeiros adentram o território, o que estaria sendo dificultado às autoridades brasileiras e aos senadores. Ainda durante a reunião desta sexta-feira, Chico Rodrigues informou que o relatório deve recomendar que parte dos equipamentos apreendidos nas ações de repressão seja utilizada para assistência social e de saúde aos indígenas. Tragédia humanitária Na audiência desta sexta-feira, Mateus Sanumá, da Associação Ipassali, disse que a vinda de muitos indígenas venezuelanos nos últimos anos contribuiu para a piora dos quadros de fome e precariedade de saúde nos territórios ianomâmi brasileiros. Ele também pediu ao Senado que tenha uma ação mais efetiva, ouvindo todas as associações que representam povos originários. Já Diego Milleo, superintendente do Ibama em Roraima, informou que pelo menos 120 toneladas de mercúrio foram despejadas nos rios que cortam o território ianomâmi nos últimos anos, o que comprometeu gravemente a pesca e causou tragédias ambientais que também foram cruciais no agravamento da fome crônica dos povos da região. Outro participante, Leonardo Covezzi, da Funai, pediu apoio do Parlamento no reforço orçamentário do órgão. Covezzi alerta que a penúria orçamentária que atingiu a Funai a partir de 2016 tem criado sérias dificuldades para as atividades da fundação. Leandro Lacerda, que assumiu a coordenadoria do distrito sanitário ianomâmi em fevereiro, confirmou que o quadro que presenciou foi de "desmonte e total ausência de estrutura". O procurador da República Alisson Marugal responsabilizou a omissão estatal nos últimos anos pela crise humanitária que se abateu sobre os ianomâmis.